Diana como Personificação da Noite (c.1765). Anton Raphael Mengs. |
1) Diana era a deusa romana da caça, dos locais e animais selvagens, da Lua, e tanto da castidade como do parto. Como as demais figuras da mitologia romana, na mitologia grega Diana tinha um equivalente sincrético, Ártemis.
Artemisia se Prepara para Beber as Cinzas de seu Marido, Mausolo (c.1630). Francesco Furini. |
2) Artemísia II de Cária, com nome dedicada à deusa (que quer dizer "de Ártemis"), foi irmã e depois esposa e sucessora de Mausolo, rei de Cária. O falecimento de Mausolo gerou nela uma mágoa única e bizarra, pela qual ela ficaria conhecida na história. É dito que ela misturava as cinzas do irmão/marido em sua bebida todos os dias, e geralmente ela é representada em pinturas de forma associada a essa prática. Ela também ordenou a construção de um sepulcro majestoso em honra ao irmão/esposo, o Mausoléu de Halicarnasso, lembrado como uma das Sete Maravilhas do Mundo Antigo.
Artemisia absinthium |
3) Artemísia II de Cária era uma botanista, interessada nas qualidades medicinais das plantas. De acordo com Plínio, em sua História Natural, "mulheres também buscaram a glória de nomear plantas, como a erva que ganhou o nome de Artemísia, esposa de Mausolo, que antes era chamada parthenis" (Plínio, História Natural, XXV.36). Hoje Artemisia é um gênero da família Asteraceae, o mesmo das margaridas.
4) A este gênero pertence a planta de nome científico Artemisia absinthium, popularmente conhecida como losna, sintro, erva-santa ou absinto. Originária da Europa e Ásia, tem folhas que são verde-acinzentadas em cima e esbranquiçadas por baixo. A planta tem gosto amargo. É usada como vermífugo, contra dispepsia, como estimulador de apetite, e para várias doenças infecciosas.
Além de já ter sido usada no lugar do lúpulo para fazer cerveja, e para dar sabor a outras bebidass como o vermute, a planta dá nome à bebida de que é o principal ingrediente, o absinto. Originária da Suíça, feita primariamente com absinto, anis (erva-doce) e funcho, a bebida tem tradicionalmente cor verde e por isso foi apelidada de la fée verte (a fada verde). Ela é engarrafada com alto teor alcoólico, para ser diluída com água antes de ser consumida. A diluição tradicional é feita com o uso de uma colher de absinto -- perfurada -- sobre a boca da taça; um torrão ou cubo de açúcar é colocado sobre a colher e a água é despejada sobre o açúcar. O absinto foi extremamente popular na virada do século XIX para o XX, principalmente entre os artistas.
5) A Bíblia, em Apocalipse, 8:10-11, traz: "E o terceiro anjo tocou a sua trombeta, e caiu do céu uma grande estrela ardendo como uma tocha, e caiu sobre a terça parte dos rios, e sobre as fontes das águas. E o nome da estrela era Absinto, e a terça parte das águas tornou-se em absinto, e muitos homens morreram das águas, porque se tornaram amargas." A planta absinto é mencionada sete vezes no Antigo Testamento e uma no Novo Testamento, todas as vezes com referência ao seu amargor.
6) Wormwood (2017) é uma minissérie da Netflix dirigida por Errol Morris. É um docudrama baseada na história real de Frank Olson, um cientista especialista em armas biológicas empregado da CIA (Agência Central de Inteligência dos EUA) que supostamente cometeu suicídio em 1953. Porém, Olson na verdade foi uma das cobaias involuntárias do Projeto MKUltra, um programa ilegal da CIA que experimentava com técnicas e métodos para influenciar mentes. O nome do documentário faz uma relação de armas biológicas com a passagem bíblica, "Wormwood" sendo o nome em inglês da planta absinto.
7) O Projeto MKUltra, uma resposta às supostas práticas dos soviéticos, chineses e norte-coreanos no campo do controle mental, pretendia explorar todas as formas de influenciar a mente. Foram feitos experimentos com hipnose, estímulos sonoros, eletrochoque e implantes cerebrais, mas as drogas receberam grande atenção. Dentre experimentos com todo tipo de droga, ganhou destaque o LSD, que depois viria a dominar vários dos programas do Projeto.
8) O LSD, ou dietilamida do ácido lisérgico, foi sintetizado em 1938 pelo sueco Albert Hofmann. Foi deixado cinco anos de lado, até que em 16 de abril de 1943, ao trabalhar novamente com a substância, Hofmann acidentalmente tocou nela com a ponta dos dedos e sentiu seus poderosos efeitos. Três dias depois, ele ingeriu intencionalmente 250 mcg de LSD, mas só sentiu os efeitos quando estava indo de bicicleta para casa. Por isso, o dia 19 de abril de 1943 é conhecido como o "Dia da Bicicleta": a primeira "viagem" intencional com LSD.
Cevada com cravagem. Foto de |
9) Como seu nome diz, o LSD deriva do ácido lisérgico. Por sua vez, este ácido também tem nome que explica sua origem, pois veio da lise de alcalóides do ergot. Os fungos ergot pertencem ao gênero Claviceps, com o mais difundido sendo o Claviceps purpurea, um parasita do centeio e outros cereais. Tem o nome popular de cravagem, esporão-do-centeio, grão-de-corvo, cornizó, cornelho ou dente-de-cão. O consumo de cereais com cravagem causa o ergotismo, também conhecido como ergotoxicose ou Fogo de Santo Antônio.
10) Apesar da triste doença que o fungo causa, por séculos o extrato de cravagens foi usado por parteiras e médicos para acelerar o parto. A mais antiga menção é de 1582, com o médico alemão Adam Lonicer recomendando "três esclerócios de cravagem para acelerar as contrações do parto prolongado". Em 1836, o Dispensatory of the United States (EUA) recomendava 15 a 20 grãos de esclerócio para induzir contrações uterinas, e em 1839 o Codex Pharmacopée Française (França) impunha que todas as farmácias deveriam manter cravagens em seus estoques.
11) Retornamos ao ponto de partida, se lembrarmos que Diana/Ártemis era, dentre outros atributos, a deusa do parto.
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