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25 de maio de 2010

A revisão preliminar

Ao escrever um texto, percebi algumas etapas pelas quais, de uma forma ou outra, percorro até chegar a um resultado que considere satisfatório. Depois de formado o conceito ou ideia inicial, há a definição de elementos mínimos, passando à criação do texto em si. Depois de muito experimentar, passei a prezar mais os textos produzidos em um impulso espontâneo, do que os estruturados conforme um plano preliminar. Ou seja, quando deixei de lado uma ideia para fazer pesquisas, encontrar material, criar perfis para personagens e definir elementos da ambientação, a vontade para contar a história foi se atenuando até, em vários casos, desaparecer. Insistir em escrever a história com pouca ou nenhuma motivação teve resultados péssimos.

Seguir o impulso inicial, apesar de também ter rendido muitos textos de falsa qualidade - aqueles que julgamos excelentes assim que terminamos, mas quando voltamos a ler depois de um tempo nos causam vergonha - rendeu os melhores contos que escrevi. Posso descrever esse impulso como uma ideia para uma história que envolve tanto os seus pensamentos que não é possível pensar em outra coisa. E ao pensar nela, os detalhes da história vão surgindo e preenchendo a cabeça, e precisam ser colocados para fora para dar lugar aos que se seguem, sob o risco de não ser possível lembrar de tudo depois.

Seja esquematizado, seja espontâneo, a criação desse corpo de texto inicial é exatamente isso, uma base. Há então a etapa da revisão do próprio autor. Eu procuro fazer nesse momento uma revisão superficial e rápida procurando apenas erros grosseiros e últimas adições. Então deixo o texto de lado, para pensar sobre a história sem lê-la. E é nessa etapa em que realizo pesquisas e busco outros materiais e referências com que possa enriquecer o texto. Nos dias seguintes, posso fazer uma ou outra alteração baseada na "leitura sem ler" e no material pesquisado, para então dar a etapa como concluída. Tive e superei um vício possível nessa etapa que é o de continuar adicionando e alterando o texto-base pontual e gratuitamente, ultrapassando um mero ajuste estético ou melhorias na língua ou na coesão. O escritor então nunca pára de mudar o texto, e se persistir nisso o resultado final pode ficar poluído e instável, com fluidez e coesão prejudicadas.
 
Encerrada a revisão do autor, o processo criativo ainda não terminou, por melhor - ou pior - que esteja o texto. O passado está cheio de exemplos de artistas que consideravam obras aclamadas como suas obras-primas como sendo inferiores a outras, obscuras e menosprezadas; ou que em ímpetos de frustração ou desencanto destruíram grandes porções de suas obras. Atribuo a isso o fato de o autor ser um péssimo crítico de sua própria obra, se admitir interpretação outra que não a sua própria. Querendo dizer que, a menos que o autor pretenda que o sucesso de seu texto seja a compreensão pelo leitor de uma ideia prestabelecida, que tenha apenas uma interpretação, ele próprio terá de recorrer à opinião de outras pessoas sobre o texto, para que eles possam interpretá-lo conforme seus próprios conhecimentos e convicções.

Esta etapa faz parte do processo criativo. Não considero o texto ainda como definitivo, tentando me manter aberto para as sugestões, críticas e dúvidas desses "leitores de teste". Aberto, vale dizer, na medida certa; creio ser fundamental estar convicto do objetivo do texto, e de qualquer escolha estilística, para que haja um critério para filtrar as opiniões recebidas. Eu pratico um equilíbrio entre prezar a opinião a ponto de ver como o texto ficaria com a alteração sugerida, e me resguardar o direito de não fazê-la se não fizer sentido. O que faço idealmente é passar o texto como estiver para a pessoa ler, para então contar para ela a história e esclarecer o objetivo e a trama, visando detectar pontos obscuros, buracos na trama, inconsistências e outros elementos reparáveis. Se a pessoa ler com atenção aos detalhes e ainda assim não compreender a trama ou tirar conclusões indesejáveis, é possível ao escritor ouvir os argumentos para a interpretação e consertar o texto - ou, o que é extremamente válido, ter uma noção alternativa da história, que pode motivá-lo a não alterar nada e permiti-la.

É difícil encontrar, todavia, alguém disposto a ler o texto - talvez várias vezes - e conversar assim tão profundamente com o autor. Na maioria das vezes, quase suplico para que as pessoas que leiam um texto apontem erros e comentem a história. Percebo que há um receio natural de fazer críticas ao texto diretamente ao autor. Acho que é o autor quem deve quebrar esse receio se acha válido receber opiniões sobre seus textos, mas é bastante difícil. Para mim tem funcionado perceber quais pessoas estão mais dispostas e insistir com elas, sempre demonstrando estar aberto às críticas que vierem, para que elas se sintam à vontade para se expressar.

Considero extremamente válida essa revisão preliminar, utilizando os "leitores de teste", mas como já mencionei em mensagem anterior, ela não deve ser considerada suficiente para gerar um texto definitivo. É fundamental a submissão do texto à revisão técnica, visando o aperfeiçoamento e limpeza final do texto e, com isso, uma tranquilidade maior para o autor que visa publicá-lo.

1 comentários:

Blog do Beto Lemela

Você escreve muito bem. Seus livros parecem interessantes. Já publicou os dois, ou apenas o primeiro ? Estão a venda apenas em Curitiba ?
Continue e escreva mais no seu blog.

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