Meus olhos cheios de lágrimas estão fixos na figura decrépita na cama. No rosto do velho, um sorriso. Um sorriso imóvel. Como todo o resto. Mesmo assim, eu não queria deixá-lo ir.
Quando era menino, em uma noite de brincadeira particularmente divertida, ficou tarde e meu pai me chamou para ir dormir. Naturalmente, eu não quis. Não houve argumento que o convencesse, todavia, e logo eu estava na cama, de braços cruzados, com ele colocando as cobertas em cima de mim. “Não é justo”, resmunguei, fazendo bico, “quando a gente está no melhor da brincadeira, é hora de dormir. O tempo acaba tão rápido”. Meu pai parou, hesitou e balançou a cabeça, dizendo apenas que “você tem que se organizar, só isso”.
Reclamei, então: “Ah. Queria mais tempo pra brincar”. Meu pai ergueu as sobrancelhas, olhou sobre os ombros para ter certeza que minha mãe não estivesse por perto e, chegando bem pertinho, me cochichou: “Se não contar para a sua mãe, eu te ensino como”. Claro que eu concordei — os olhos brilhando com a promessa.
“Você tem que ficar sem se mexer, respirar bem fundo e prender a respiração, apertar os olhos bem forte, cruzar o máximo de dedos que você puder e se encolher o máximo que conseguir. Então o tempo vai parar, enquanto você ficar assim. E se você praticar bastante, não vai precisar fazer mais nada disso.”
Ele me deu um beijo na testa, apagou a luz e foi dormir. Eu comecei a praticar naquela mesma noite. Olhei a hora no meu rádio-relógio e fiz tudo o que meu pai me disse. Logo descobri que não conseguia segurar o fôlego nem por um minuto sequer. O tempo realmente parecia não passar naquela posição desconfortável, mas eu precisava saber.
No dia seguinte, durante o almoço, perguntei para meu pai como faria para saber se o tempo realmente estava parado. Mais tarde naquele dia, ele me mostrou como eu fazia para ligar a função de cronômetro do rádio-relógio. Naquela noite, antes de dormir, eu acionei o relógio e assumi a desengonçada posição para parar o tempo. Fechei os olhos com o relógio marcando sete segundos.
Contei em silêncio o tempo em que conseguia prender a respiração. Encolhido daquele jeito, não aguentava mais do que trinta segundos. Soltando o ar dos pulmões, abri os olhos para saber se o cronômetro havia corrido durante aquele tempo. Já suspeitava que meu pai estava me enganando, como fazem os adultos para burlar a manha infantil com alguma estória que estimulasse a imaginação.
Quando era menino, em uma noite de brincadeira particularmente divertida, ficou tarde e meu pai me chamou para ir dormir. Naturalmente, eu não quis. Não houve argumento que o convencesse, todavia, e logo eu estava na cama, de braços cruzados, com ele colocando as cobertas em cima de mim. “Não é justo”, resmunguei, fazendo bico, “quando a gente está no melhor da brincadeira, é hora de dormir. O tempo acaba tão rápido”. Meu pai parou, hesitou e balançou a cabeça, dizendo apenas que “você tem que se organizar, só isso”.
Reclamei, então: “Ah. Queria mais tempo pra brincar”. Meu pai ergueu as sobrancelhas, olhou sobre os ombros para ter certeza que minha mãe não estivesse por perto e, chegando bem pertinho, me cochichou: “Se não contar para a sua mãe, eu te ensino como”. Claro que eu concordei — os olhos brilhando com a promessa.
“Você tem que ficar sem se mexer, respirar bem fundo e prender a respiração, apertar os olhos bem forte, cruzar o máximo de dedos que você puder e se encolher o máximo que conseguir. Então o tempo vai parar, enquanto você ficar assim. E se você praticar bastante, não vai precisar fazer mais nada disso.”
Ele me deu um beijo na testa, apagou a luz e foi dormir. Eu comecei a praticar naquela mesma noite. Olhei a hora no meu rádio-relógio e fiz tudo o que meu pai me disse. Logo descobri que não conseguia segurar o fôlego nem por um minuto sequer. O tempo realmente parecia não passar naquela posição desconfortável, mas eu precisava saber.
No dia seguinte, durante o almoço, perguntei para meu pai como faria para saber se o tempo realmente estava parado. Mais tarde naquele dia, ele me mostrou como eu fazia para ligar a função de cronômetro do rádio-relógio. Naquela noite, antes de dormir, eu acionei o relógio e assumi a desengonçada posição para parar o tempo. Fechei os olhos com o relógio marcando sete segundos.
Contei em silêncio o tempo em que conseguia prender a respiração. Encolhido daquele jeito, não aguentava mais do que trinta segundos. Soltando o ar dos pulmões, abri os olhos para saber se o cronômetro havia corrido durante aquele tempo. Já suspeitava que meu pai estava me enganando, como fazem os adultos para burlar a manha infantil com alguma estória que estimulasse a imaginação.
"Entre Segundos" é o quinto conto do livro e o segundo a se passar em épocas modernas. A estória se passa no presente, sem local definido.
É um dos dois contos escritos visando o tema do tempo com o fim de integrar a coletânea (o outro sendo "Ouroboros"), os demais tendo sido escritos antes do tema ser estabelecido. Sua conexão com o tema do Tempo é dupla: o protagonista deseja a capacidade de parar o tempo e ela lhe é ensinada pelo pai, em um contato entre gerações que é fundamental para a estória.
O título não é apenas uma alusão ao que o protagonista almeja fazer, mas também a algo que ele aprende e que é o desfecho da narrativa.
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